Hoje eu vi uma nuvem.
Caminhando entre prédios e pessoas, fluindo contra a corrente de sonhos e frustrações, repentinamente olhei para o alto.
Olhei para o céu, para um azul tão profundo que me fez congelar no tempo infinito de um piscar de olhos, no espaço imenso entre dois passos.
Olhei para o céu e vi uma nuvem. Não era especial, multicolorida, misteriosa ou cenográfica.
Não era nuvem de amanhecer ou pôr do sol, sequer nuvem de meio-dia.
E entretanto, era tão bela!
Ninguém mais via a nuvem.
Ela passava lentamente, um colosso suave no mais profundo azul -- e ninguém mais olhava para ela.
Aquelas pessoas viam (tenho certeza disso) o asfalto.
Percebiam o concreto, os seus horários, seus compromissos, seus sucessos, sua pressa e a tediosa rotina de uma mente embotada de desejos.
Mas nenhuma -- nem mesmo uma única delas -- via a nuvem.
Eu fui afortunado. Em um momento simples e causal, despertei por alguns instantes do sono medíocre de minha ignorância e olhei para o céu.
Olhei para aquele cenário imenso por trás da banalidade insensível, e vi a força do momento.
Ninguém mais via a nuvem, e apesar disso ela passava sem rancor ou alarde, generosamente nos oferecendo a dádiva de sua momentânea realidade.
A vida é arte pura, feita por momentos grávidos de possibilidades.
Apesar dos medos, apesar dos anseios, da cobiça e da frustração.
Apesar dos ódios, da mesmice, do desprezo e da ilusão.
Apesar de tudo, existem as nuvens...
Monge Kōmyō
Janeiro de 2014